Atualmente no Brasil, a questão da transmissibilidade de bens digitais é um tema que permeia debates e discussões em razão de ainda não existir legislações regulamentadas e direcionadas à transmissão do acervo digital. Porém, é inegável que estamos caminhando a passos largos em direção à realidade virtual e tudo o que produzimos no ambiente digital gera obrigações, deveres e direitos sobre a pessoa física que atua nesse espaço.
Conhecido como patrimônio digital, é tudo o que uma pessoa ou empresa cria e disponibiliza na Internet, como fotos, vídeos, textos, ebooks, obras de arte, NFT’s, filmes, blogs e entre outros formatos de conteúdos. Esse acervo digital assume o status de patrimônio, com caráter econômico ou existencial e que pode ser considerado um bem de valor jurídico. Portanto, mesmo sendo digital, constitui os direitos e heranças aos sucessores.
O patrimônio já é um instituto jurídico consistente no âmbito do direito, porém quando falamos em bens digitais e a sua herança, nos deparamos com a ausência de seu reconhecimento total e com a necessidade de se estabelecer normas que especifiquem e orientem nesse sentido.
Para o direito, bens são todas as coisas materiais ou imateriais que possuem algum valor econômico e que podem servir de objeto a uma relação jurídica. De acordo com os juristas Victor Hugo Alonso Casarolli e Maria Carolina de Moraes Ferreira, pode-se extrair a noção de que bem digital é um bem que se adequa nesta definição de bens, porém de forma imaterial, já que não há dúvidas em considerar patrimônio alguns exemplos de bens digitais, como blogs, sites, livros digitais, criptomoedas etc, pois é possível verificar nelas a existência de ligações jurídicas dotadas de conteúdo financeiro.
No intuito de preservar as ações produzidas e realizadas no digital, é de extrema importância o desenvolvimento de políticas e leis específicas para a regulação da sucessão desses materiais, fazendo com que sejam mantidos nas gerações futuras e para que haja a devida manutenção e transmissão desses bens.
A Constituição Federal, em seu art. 5º, prevê o Direito à Herança como sendo um direito e garantia fundamentais. Porém, quando falamos em herança digital ainda nos deparamos com lacunas na nossa legislação. Por hora, o que se tem de concreto é apenas de um Projeto de Lei nº 4.099/2012 do Deputado Jorginho Mello, que pretende inserir alteração no art. 1.788 do Código Civil, no sentido de autorizar o acesso de herdeiros a arquivos digitais dos falecidos.
Em todo caso, independentemente de haver previsão legal sobre a transmissão por herança, a lei brasileira preferencia a manifestação de vontade do de cujus. Portanto, deve-se respeitar o desejo do falecido à sua sucessão de herança digital, visto que, de acordo com o art. 1.857 do Código Civil, toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, sobre a totalidade ou parte dos seus acervos para depois de sua morte.
Apesar disso, esse é um assunto que não possui o tratamento jurídico adequado, estando os bens digitais em um ambiente ainda desconhecido, tornando-se difícil a compreensão do que realmente acontecerá com os bens deixados na Internet post mortem e como será feita a partilha dessa herança digital.
De acordo com os termos de serviço da Apple, as contas de usuários e todo o seu conteúdo relacionado são intransferíveis, o que significa que, após a morte do proprietário, a Apple não permite que outra pessoa assuma o controle da conta e dos bens digitais armazenados, a menos que tenham sido expressamente autorizados em vida. Agora, quando falamos em redes sociais, as políticas de privacidade podem variar, mas a maioria não permite a transferência de controle de uma conta em caso de morte. No entanto, algumas redes sociais possuem uma opção na qual o proprietário da conta pode nomear uma pessoa confiável para gerenciar a sua conta pós-morte, como é o caso do Facebook. Já o Instagram, por exemplo, autoriza apenas que a conta seja excluída ou transformada em uma conta de memorial.
Notavelmente, percebemos ao longo dos anos os impactos da tecnologia e da digitalização de patrimônios pessoais e com isso, a necessidade de um processo de adaptação pelo Direito Sucessório brasileiro. Afinal, os patrimônios e heranças digitais não implicam somente na adoção da tecnologia, mas também na preservação desses bens e no repasse para os herdeiros.
Cada vez mais o avanço tecnológico tem levado a sociedade a gerar um acervo imenso desses patrimônios digitais que necessitarão ser protegidos e, portanto, é evidente que devemos explorar essa nova realidade, a fim de precaver questões futuras e dar segurança jurídica aos herdeiros. Para garantir que seus bens digitais e contas de redes sociais sejam transferidos como você deseja, é importante planejar com cuidado e procurar aconselhamento jurídico.