O direito ao esquecimento é um conceito jurídico que visa preservar a reputação e a privacidade da pessoa e compreende os direitos previstos no art. 21º do Código Civil, quais sejam, direito à vida privada, a intimidade e a honra, todos decorrentes do princípio da dignidade da pessoa humana. Referido direito trata da possibilidade de determinados fatos, mesmo que verídicos, ocorridos na vida de um indivíduo, não venham a ser de conhecimento público.
No Brasil, esse tema tem sido objeto de debates nos últimos anos, principalmente devido ao avanço das tecnologias de informação, que praticamente eternizam fatos no ambiente digital. O ponto central das discussões reflete um conflito entre a liberdade de expressão e os direitos fundamentais do indivíduo, como a sua privacidade e intimidade. Deste modo, há uma vertente de interpretação que reconhece a informação como um direito de todos e que deve ser de conhecimento público os fatos relevantes da vida social e política, assim como os fatos históricos, publicidades e notícias. Por outro lado, existem aqueles que defendem a existência do direito ao esquecimento como uma expressão da dignidade da pessoa humana.
Em março de 2013, na VI Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, foi aprovado um enunciado defendendo a existência do direito ao esquecimento – Enunciado 531: “A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento”.
Apesar de o enunciado não possuir efeito legal, ele serve de base para interpretações, objetivando criar diretrizes mais acertadas e concretas para esse tema tão controvertido e orientação para os profissionais do direito. A 4ª Turma do STJ, em dois julgados, afirmou que o sistema jurídico brasileiro protege o direito ao esquecimento. (REsp 1.335.153-RJ e REsp 1.334.097-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgados em 28/5/2013).
Todavia, apesar de tal entendimento dos ministros, o tema passou por reformas judiciais recentemente pelo Supremo Tribunal Federal em 2021, concluiu que o direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal. Segundo a Corte, eventuais excessos ou abusos do exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, com base em parâmetros constitucionais e na legislação penal e civil.
Apesar do entendimento do STF, para o ministro Gilmar Mendes, no que tange aos direitos à intimidade e à vida privada, a exposição humilhante e vexatória de dados, da imagem e do nome de pessoas é indenizável, ainda que haja interesse público, histórico e social, devendo o tribunal de origem apreciar o pedido de indenização. O ministro concluiu que, na hipótese de conflito entre normas constitucionais de igual hierarquia, como no caso, é necessário examinar de forma pontual qual deles deve prevalecer para fins de direito de resposta e indenização, sem prejuízo de outros instrumentos a serem aprovados pelo Legislativo.
Nesse sentido, podemos citar os casos em que antigos atores e atrizes de filmes pornográficos são expostos anos após encerrarem suas carreiras atuando em filmes adultos. Na maioria das vezes, essas pessoas já refizeram suas vidas e acabam sofrendo as consequências da reexibição daquele conteúdo e a sua imagem associada a eventos específicos do passado, podendo causar sérios danos emocionais à vítima.
O interesse público deve preponderar sempre que se trate de fatos genuinamente históricos. Porém, nesses casos, as informações são pretéritas de cunho pessoal do indivíduo e, portanto, destituídas de relevância histórica ou social. Apenas contribui para que fiquem permanentemente expostas ao acesso de todos, causando situação vexatória que impede a pessoa de seguir com a sua vida.
É evidente que existe uma clara controvérsia a respeito desse assunto e que se trata de um conceito complexo, mas quais seriam os limites da liberdade de imprensa e de expressão em geral e como conciliar o direito ao esquecimento com o direito à informação?
Deve-se analisar se existe um interesse público atual na divulgação da informação. Se ainda persistir, não há que se falar em direito ao esquecimento, sendo lícita a publicidade daquela notícia. É o caso, por exemplo, de “crimes genuinamente históricos, quando a narrativa desvinculada dos envolvidos se fizer impraticável”, afirma ministro Luis Felipe Salomão.
Por outro lado, se não houver interesse público atual, a pessoa poderá exercer seu direito ao esquecimento, devendo ser impedidas as notícias sobre o fato que já ficou no passado.