Como se sabe, a propaganda política é um recurso previsto na legislação brasileira utilizado para atrair a atenção do eleitorado, assim como a sua veiculação gratuita na televisão e no rádio. Nos dias atuais, o uso das redes sociais vem ganhando cada vez mais força e gerando um alcance muitas vezes maior. Por esse motivo, os candidatos estão utilizando as plataformas digitais com o objetivo de chamar a atenção das pessoas durante o período das eleições.
As mídias digitais comportam espaços importantes onde o candidato pode usufruir de artifícios para se apresentar ao público com acesso muito mais fácil. Esse cenário ainda admite formas de linguagens que permitem a comunicação mais adequada para cada tipo de público.
O processo eleitoral prevê a veiculação gratuita das campanhas, porém, o conteúdo das propagandas está protegido pelo direito autoral, inclusive nas plataformas de redes sociais como Twitter, Facebook, Instagram, Telegram, Youtube, TikTok e entre outras. Portanto, é imprescindível que o candidato se atente à Lei de Direitos Autorais, Lei Federal nº 9610 de 1998, no momento da criação da campanha eleitoral para que o conteúdo divulgado não incorra em violação desses direitos.
É muito comum também a utilização pelos candidatos de músicas, fotos e audiovisuais no ambiente digital, como o uso de memes, jingles e imagens. Contudo, é importante se atentar primeiro à titularidade do conteúdo para compreender quem terá o direito autoral sobre o material da campanha.
Além do material utilizado em campanha, somente aquele que for titular dos direitos autorais é quem poderá autorizar ou não a utilização futura do conteúdo, como o reuso em outras campanhas por exemplo. Portanto, é de suma importância que sejam firmados contratos específicos com os criadores das obras, para que o candidato possa adquirir o direito de utilização em suas campanhas.
Outro elemento bastante utilizado nas redes sociais pelos políticos candidatos é a paródia, que são criações feitas com base em obras preexistentes e geralmente contém ironia, sátira ou crítica.
De acordo com o artigo 47 da Lei de Direitos Autorais, “são livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito”. Além disso, as paródias não podem ferir a honra do autor e nem mesmo constrange-lo.
Nesse sentido, o cantor Roberto Carlos acionou a Justiça em 2014 e abriu um processo contra o humorista e também candidato Tiririca, por ter gravado uma paródia de “O Portão”, música de sua autoria, em campanha eleitoral. O deputado foi condenado a pagar indenização de R$ 30 mil em sentença publicada em 2015, mas recorreu da decisão.
Segundo a defesa de Roberto Carlos, a paródia ultrapassava os limites legais de seu direito de personalidade, bem como seria capaz de induzir eleitores e o público em geral ao erro, associando de forma indevida a imagem do cantor com a do político.
Em 2019, a 3ª Turma do STJ decidiu que a paródia não violou os direitos autorais do cantor. Essa posição foi reafirmada pela 2ª Seção, em votação unânime. Segundo o ministro e relator Luis Felipe Salomão, a paródia política deve cumprir alguns requisitos para a sua reprodução ser legítima, e para ele, a paródia de Tiririca seguiu todas as regras.
Não é apenas no Brasil que esse tema é discutido. Nas eleições presidenciais dos Estados Unidos em 2016, o então candidato Donald Trump utilizou em sua campanha a canção “Nessun dorma”, do compositor italiano Giacomo Puccini e interpretada por diversos tenores, dentro eles, Luciano Pavarotti. Após tomar conhecimento da campanha, a família do falecido tenor publicou uma carta aberta solicitando que o candidato cessasse a utilização da música, por entender que os valores que Pavarotti cultivou durante a vida iam de encontro ao posicionamento do candidato.
Como se vê, o tema é polêmico, observando-se linha tênue entre a liberdade de expressão e apropriação disfarçada em campanha política. Até agora, o assunto ainda é pouco analisado pelos tribunais brasileiros, e por isso é essencial o fomento de debates para facilitar o entendimento e promover maiores discussões diante de um cenário com tantas incertezas. Ainda assim, é importante que os candidatos se atentem aos limites permitidos pela Lei de Direito Autoral para que a divulgação de seu material de campanha não incorra em violações.
Em janeiro deste ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) proporcionou uma série de três audiências públicas promovidas pela Corte para discutir a resolução que atualizará as regras para as eleições municipais de 2024. Dentre os temas debatidos, haviam discussões sobre propagandas eleitorais, representações ou reclamações e ilícitos eleitorais.
A cantora e compositora Marisa Monte participou dos debates e defendeu que deveria ser direito do autor poder barrar paródias para as eleições. – “Me sinto violentada com a possibilidade de a minha obra ser utilizada, podendo ser adulterada, sem autorização, para fins políticos em uma campanha eleitoral”, declarou a cantora. Para ela, quando as paródias são usadas como propaganda, há um desvio de finalidade – do humor, para a promoção de um candidato, partido ou ideologia.