Recentemente, a Rede Globo foi condenada pelo Tribunal de Justiça de SP a indenizar a compositora Alda Cavalcante Bezerra pelo uso indevido de música de sua autoria no programa Big Brother Brasil.
A autora, que é professora e também divulga seus trabalhos como compositora e intérprete de músicas em canal do Youtube, ajuizou ação contra a emissora ao tomar ciência da utilização da música “Despedida”, de sua autoria, no programa BBB, sem sua prévia autorização, bem como sem lhe dar os devidos créditos da composição e interpretação da música.
A Rede Globo não negou a utilização da obra por 21 segundos no programa, mas afirmou em sua defesa que, mediante convênio com a UBEM, tentou identificar a titularidade da obra, porém não teve êxito.
Em primeira instância a emissora foi condenada ao pagamento de indenização de R$ 15.000,00 por danos morais, além de danos materiais a serem apurados em fase de liquidação de sentença.
Em sede de apelação, o Desembargador José Carlos Costa Netto negou provimento ao recurso da Globo, afirmando, dentre outros fundamentos, que “não convence” o argumento de que a emissora tentou localizar a autora da obra musical, pois “uma simples busca na internet já daria pistas sobre a compositora”. Além disso, “não se pode crer que um programa como Big Brother Brasil, veiculado pela empresa de comunicação do porte da ré, Grupo Globo, possa ser inexperiente a ponto de ignorar a existência do trabalho de (no mínimo) um autor na criação de uma obra musical”.
O acórdão é primoroso e desconstrói todos os argumentos da apelante com sólidos fundamentos legais.
Em primeiro lugar, ele afasta a tese de que, por se tratar de pequeno trecho da obra, não haveria necessidade de autorização prévia. Segundo o desembargador, o uso de uma música chamada “despedida” justamente em dia de eliminação no BBB “assumiu papel de destaque ao completar o programa que era dedicado a saída de um dos participantes; era um programa de despedida”.
Assim, para Costa Netto, a reprodução da música merece tratamento jurídico semelhante ao da sincronização, porque a obra intelectual foi incluída em outra em determinado contexto específico, não prescindindo de autorização prévia da titular de direitos autorais.
Além disso, afirmou o acórdão que 21 segundos em obra musical de 3 a 4 minutos não pode ser considerado pequeno trecho para abrigar-se no permissivo legal da dispensa de autorização prévia, já que corresponde a cerca de 10% sobre o seu todo.
Conclui que a utilização indevida da música sem a autorização da titular e sem a atribuição dos devidos créditos de autoria, fato reconhecido pela ré, viola os direitos autorais, sendo de rigor a indenização pelos danos decorrentes.
Utilizando como parâmetro a remuneração da emissora para veiculação de publicidade, e considerando os 21 segundos de utilização da música, determinou que o valor da indenização a título de dano material seja correspondente a 10% (dez por cento) do valor constante para cada segundo da Tabela de Publicidade da rede de televisão demandada.
Como reparação de danos morais, o acórdão acolheu o recurso da autora para majorar a condenação em R$ 20.000,00, para fazer frente aos malefícios da violação aos direitos de autor, pois, além do ressarcimento da ofendida medido pela extensão do dano, impõe-se o efeito pedagógico trazido com a punição do ofensor.
O acórdão merece ser lido na íntegra pois, enfrentando a questão com profundidade e ousadia, mostrou que o respeito ao direito autoral deve se impor, com a efetiva valorização do trabalho artístico, bem como, com o reconhecimento da importância da função social da proteção desse direito.
Apelação Cível n° 1002488-76.2019.8.26.0637, 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, Des. José Carlos Costa Netto, 13.07.2021