O estelionato sexual, embora não figure entre os tipos penais mais conhecidos pela população em geral, reveste-se de grande importância para a compreensão e atuação da sociedade diante de crimes que afetam a dignidade e a integridade das vítimas. Apesar de não ser muito divulgado e de não haver tantos debates sobre o tema, o crime ainda é bastante comum.
Trata-se de uma prática criminosa que envolve conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima, configurando séria violação dos direitos individuais.
O tipo penal está descrito no art. 215 do Código Penal e prevê pena de dois a seis anos de reclusão e multa, se o crime for cometido com o fim de obter vantagem econômica.
Importante destacar que a prática desse crime será sempre caracterizada por meio de conduta fraudulenta que retira o poder de decisão da vítima sobre os atos sexuais, sem que haja violência ou grave ameaça. Essa é a diferença para o crime de estupro, do qual se qualifica única e exclusivamente pelo quesito da violência e da grave ameaça, retirando a capacidade de resistência da vítima.
Para melhor compreensão das circunstâncias em que este crime ocorre, citamos alguns exemplos:
A figura de um líder religioso que se aproveita da vulnerabilidade da vítima e a convence de praticar ato sexual ou libidinoso; O irmão que pratica atos sexuais ou libidinosos com a namorada de seu irmão gêmeo, sem que ela perceba; o agente, fantasiado como o marido/namorado em baile de máscaras, consegue manter ato libidinoso com a esposa que não distingue um do outro.
Importante reforçar que, independentemente do cenário, se a vítima for menor de quatorze anos, o tipo penal migra para o art. 217 A do Código Penal, referente à estupro de vulnerável.
A jurisprudência é favorável às vítimas desse tipo penal através de condenação:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. VIOLAÇÃO SEXUAL MEDIANTE FRAUDE. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. TIPICIDADE DA CONDUTA. FRAUDE CONFIGURADA. CONDENAÇÃO MANTIDA. 1. Nos termos do art. 215, do Código Penal, pratica o crime de violação sexual mediante fraude quem tem conjunção carnal ou pratica outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima. 2. Na hipótese, não há falar em absolvição por atipicidade da conduta, porquanto restou comprovado que a ofendida somente consentiu para a ocorrência da relação sexual durante a realização da massagem tântrica pelo réu porque estava totalmente envolvida no engodo do acusado e, não sendo capaz de livremente manifestar a sua vontade, aceitou o que lhe era dito pelo denunciado: que a conjunção era necessária para abertura dos chacras e que ambos deveriam comungar do mesmo desejo. 3. Recurso conhecido e não provido.
(TJ-DF 07200065120198070001 – Segredo de Justiça 0720006-51.2019.8.07.0001, Relator: CRUZ MACEDO, Data de Julgamento: 08/10/2020, 1ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe : 15/10/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)
STJ: 2. Hipótese em que a denúncia descreve que o recorrente, em tese, simulando a prática de procedimento médico ginecológico supostamente adequado, submetia suas pacientes a atos sexuais, sem consentimento válido destas. 3. Descrição fática contida na inicial acusatória que se amolda perfeitamente ao tipo penal descrito no art. 215, caput, Código Penal, pois o ato libidinoso ocorreu de maneira dissimulada, impedindo, assim, a livre manifestação da vontade das vítimas. (AgRg no RHC 43.254/AM, 5ª T, rel. Ribeiro Dantas, j. 23.06.2020)
TJ-RS: ‘Acusado que, na condição de ‘Pai de Santo’, atendeu a vítima, que buscava seus trabalhos por problemas de saúde, para a realização de uma ‘limpeza espiritual’, ocasião em que a levou para uma sala, trancou a porta, aumentou o volume do som, vendou a vítima e, após inicial o ritual, a ordenou a ficar nua, a qual, embora constrangida, se despiu. Ato contínuo.
(Apelação Crime 70081533176, 6ª Câmara Criminal, rel. Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, 27.06.2019, v.u);